• 18

    janeiro

  • Voto impresso e voto eletrônico – Possibilidades e impactos no Brasil

     

    A última eleição presidencial americana foi marcada por diversas alegações de fraude e interferências indevidas de big techs e big media, como colocado pelo ainda Presidente Donald Trump. O Republicano contestou a vitória de seu oponente, Joe Biden, o que levou à recontagem dos votos em diversos estados e a contestação do resultado oriundo do Colégio Eleitoral. Foi necessária, nesse passo, até a confirmação da eleição pelo Congresso norte-americano. No entanto, a respectiva sessão foi invadida por apoiadores de Trump, que buscavam interromper a validação da vitória do político democrata e pressionar os congressistas a reconhecer a suposta reeleição do atual presidente. O episódio teve grande repercussão midiática e política, pelo mundo, sendo categorizado como “ataque à democracia” e “ato de terrorismo”.

     

    No Brasil, o Presidente Jair Bolsonaro assumiu posição clara sobre o tema, mas ponderou a necessidade de utilização de votos de papel no país, insinuando que o Brasil poderia sofrer, em 2022, um episódio semelhante ao ocorrido em Washington. Desde a eleição de 2018, Bolsonaro afirma que as urnas eletrônicas foram manipuladas para impedir sua vitória no primeiro turno e que, portanto, não seriam confiáveis. Sua intenção é aplicar votos impressos já nas próximas eleições gerais, o que renovou o debate acerca da pretensão da “minirreforma” eleitoral de 2015, a Lei nº 13.165/2015. A legislação prevê que as urnas imprimirão o registro dos votos, que serão depositados de forma automática e sem contato manual do eleitor, em local previamente lacrado. O voto somente será contabilizado após a confirmação de correspondência entre voto e impressão.

     

    Os apoiadores desse modelo de votação defendem que o voto eletrônico não permite ao eleitor conferir se o dado computado corresponde, de fato, à sua vontade e intenção. A cédula impressa seria uma garantia segura de que a legenda digitada pelo votante é a mesma registrada pela máquina, especialmente frente às violações de sigilo ocorridas durante os testes das urnas, promovidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os votos poderiam ser recontados com maior transparência e auditados conforme a necessidade. Ainda, afirmam que países como Alemanha, França e Estados Unidos não utilizam o modelo de votação por urna, pelo que o Brasil deveria acompanhar as nações mais desenvolvidas.

     

    Em contrapartida, a urna eletrônica é o meio mais ágil de se obter o resultado da votação e garantir o voto secreto, um dos pilares do atual sistema democrático. É esse o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do próprio TSE, que já impuseram uma série de restrições e impedimentos ao projeto, alegando principalmente a possibilidade de travamento da máquina de papel e os gastos das mudanças. De acordo com as contas realizadas pela corte eleitoral, a implementação de votos físicos custaria cerca de R$2,5 bilhões aos cofres públicos, ao longo de 10 anos, enquanto as urnas regulares possuiriam apenas o custo de manutenção e renovação. Ademais, as máquinas representariam um avanço tecnológico e uma desburocratização do processo eleitoral, sendo utilizadas desde o ano 2000.

     

    Nesse cenário, a deputada do PSL, Bia Kicis, propôs a Emenda Constitucional nº 135/2019, que pretende tornar obrigatória a utilização de cédulas físicas na votação e na apuração de eleições, plebiscitos e referendos. Dessa forma, os Tribunais Superiores não poderiam obstar a implementação do novo sistema, visto que o Poder Legislativo teria cumprido os requisitos para a disciplina no tema no texto da Constituição. Objetiva-se, assim, sobrepor a alteração ao Judiciário, bem como garantir que as novas urnas sejam utilizadas já em 2022. A PEC já recebeu parecer de constitucionalidade, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados (CCJC) e, agora, aguarda a designação de Comissão Especial da Câmara dos Deputados para o exame do mérito da proposição. Após a publicação do parecer de validade pela comissão, a proposta será submetida a dois turnos de discussão e votação, que requer três quintos dos votos para ser aprovada e enviada ao Senado, onde será submetida aos mesmos procedimentos antes da promulgação.

     

    O assunto divide juseleitoralistas e cientistas políticos. Qualquer que seja a solução adotada pelo Congresso Nacional, é essencial que as regras do jogo eleitoral sejam cumpridas por candidatos, partidos e pelos eleitores em geral. Alterações normativas de grande impacto, sobremodo as que gerem grandes despesas aos cofres públicos, devem ser adotadas apenas se representarem o melhor interesse da população e da Democracia, não podendo se subordinar a pressões e ameaças. Um regime constitucional é apenas tão forte quanto a legitimidade e o respeito que lhe são conferidos pelos seus cidadãos.

     

    MARIANA CAPANEMA VON BENTZEEN


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